Aviso de Cookies

Usamos cookies para otimizar as funcionalidades do site, personalizar o conteúdo proposto e dar a você a melhor experiência possível. Saiba mais em nossa Política de Cookie e Política de Privacidade

JORNADA DE TRABALHO DO TRABALHADOR DE TELEATENDIMENTO (COM ABORDAGEM NAS HORAS EXTRAS)

JORNADA DE TRABALHO DO TRABALHADOR DE TELEATENDIMENTO

(COM ABORDAGEM NAS HORAS EXTRAS)

 

HENRIQUE VINÍCIUS FRANCISCO PEREIRA

 

 

 

RESUMO: O trabalho de teleatendimento é bastante recente, e já existem mais de um milhão e quatrocentos mil trabalhadores nesta área no Brasil. A grande maioria de seus trabalhadores, são jovens em seu primeiro emprego, buscando qualificação profissional, e muitas das vezes pagar sua faculdade e cursos. Este serviço se enquadra na jornada especial de trabalho, por ser bastante extenuante, e é limitado a 6 horas diárias, e 36 horas semanais; por ser um ramo relativamente recente, ainda gera bastante polêmica sobre os direitos dos trabalhadores de tal classe, inclusive quanto à jornada de trabalho, poucas teses são pacíficas entre os juristas. A jornada especial se enquadra tanto pelo fato de ser turno ininterrupto de trabalho, quanto de ser qualificado como trabalho de telegrafia, descrito na Consolidação das Leis Trabalhistas.

 

Palavras-chave: Duração do trabalho, call center, teleatendimento.

 

                                                                                            

  1. 1.                  INTRODUÇÃO

O call center surgiu na década de 60, nos Estados Unidos, segundo Gubert, alguns anos após a invenção do telefone, ainda com poucos aparelhos instalados em casas e escritórios, um padeiro norte-americano percebeu seu enorme potencial e já em 1880, mantinha um cadastro com 180 clientes a quem oferecia seus produtos, pelo telefone. Antigamente o atendimento por telefone era oferecido por bombeiros, emergência e policiamento. As pessoas utilizavam quando era necessário, ligavam para uma central que encaminhavam a solução para o problema apresentado; de acordo com Mancini, a Ford resolveu arriscar e investiu na primeira campanha maciça de marketing por telefone. A empresa capacitou quinze mil donas de casa que, de suas residências, efetuaram vinte milhões de ligações para definir o mercado potencial de compradores de automóveis. Rapidamente a estratégia disseminou-se.

Estudos realizados nos Estados Unidos na década de 1970 comprovaram que praticamente 50% dos americanos que receberam contato por telefone, seja para vendas ou pesquisa, ouviram as ofertas. Assim, chega-se à década de 1980, com o nascimento oficial do termo telemarketing, que aportou no Brasil junto com a chegada das multinacionais americanas. As empresas perceberam que esse tipo de sistema poderia ser expandido; com a regulamentação do Código de Defesa do Consumidor praticamente todas as empresas passaram a disponibilizar para os seus clientes um serviço de atendimento ao cliente, um canal de comunicação com a empresa para registrar as reclamações dos clientes e atendê-los visando o cumprimento da legislação.

Com o passar dos tempos, estas centrais de atendimento começaram a ser vistas como ferramenta de integração e relacionamento com clientes, e menos como obrigação legislativa, tornando–se um Call Center. As centrais de atendimento e empresas de telemarketing nasceram em São Paulo não só porque recurso avançado de telecomunicações ainda não estava tão disponível como hoje pelo país afora, mas também porque a região Sudeste concentrava a maior rede de terminais telefônicos do país.

Atualmente em nosso país um dos ramos que mais cresce é o de teleatendimento, mais conhecido como call center, já são mais de um milhão e quatrocentos mil trabalhadores nesta área de serviço, tornando-se uma das categorias com a maior quantidade de trabalhadores do Brasil.

O que é trabalhador de teleatendimento, já é pacificado pela doutrina e pela jurisprudência, que é definido como, aquele realizado pelo trabalhador à distância, cuja comunicação com interlocutores clientes e usuários é feita por intermédio de voz e/ou mensagem eletrônica, com a utilização simultânea de equipamentos de audição/escuta e fala telefônica e sistemas informatizados ou manuais de processamento de dados; porém, quanto à duração da jornada de trabalho, a quantidade de horas trabalhadas semanalmente e aos intervalos intrajornada, ainda há bastante polêmica, e pensamentos bastante divergentes, não só entre os doutrinadores, mas também entre Juízes, advogados, e membros do Ministério Público do Trabalho.

Com este trabalho, busco mostrar a realidade do trabalhador de call center no Brasil, e levar ao conhecimento de todos o que lhes é garantido por lei, buscando tudo o que diz respeito a esta categoria; Organização Internacional do Trabalho, Constituição Federal, Consolidação das Leis Trabalhistas, normas específicas, e não só mostrar a lei seca, mas também, apresentar jurisprudências do Tribunal Superior do Trabalho, entendimentos dos maiores doutrinadores trabalhistas de nosso país, e comentar as polêmicas envolvendo essa área trabalhista que mais cresce no mundo e no Brasil.

  1. 2.                  JORNADA DE TRABALHO DO OPERADOR DE TELEATENDIMENTO

 

Atualmente é de conhecimento notório, que um dos trabalhos com maior desgaste emocional e até mesmo físico, é o de operador de teleatendimento, mais conhecido como trabalhador de call center, por este motivo foi adotada pela legislação vigente, uma jornada especial de trabalho, limitada a 6 (seis) horas diárias e a 36 (trinta e seis) horas semanais.

Na própria Constituição Federal este limite já vem regulamentado e dispõe em seu artigo 7°, inciso XIV que:  “jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva”.

Ocorre que, a grande maioria das vezes este limite não é respeitado, fazendo com que os trabalhadores deste ramo, façam até 7 (sete) horas diárias, e ou mais, tornando-se assim, bastante desgastante a sua jornada de trabalho, afetando diretamente no seu rendimento e na sua capacidade mental.

O trabalho do operador de teleatendimento ainda não vem especificado diretamente na Consolidação das Leis Trabalhistas, mesmo após a reforma trabalhista, tal tema não fora abordado; então, pelo entendimento dos grandes doutrinadores, este continua a ser tratado pelo artigo 227 do referido códex, o qual dispõe que:

Nas empresas que explorem o serviço de telefonia, telegrafia submarina ou subfluvial, de radiotelegrafia ou de radiotelefonia, fica estabelecida para os respectivos operadores a duração máxima de seis horas contínuas de trabalho por dia ou 36 (trinta e seis) horas semanais. (CLT, art. 227).

Desta forma, resta claro que a jornada de trabalho do operador de teleatendimento se enquadra em uma jornada especial de trabalho, para assim poder satisfazer as necessidades mentais e físicas destes trabalhadores, garantindo sua saúde e bem-estar, porém, muitas das vezes, essa jornada especial acaba existindo somente na lei.

Outrossim, insta ainda trazer à baila, o disposto no § 1º do artigo acima citado:

Quando, em caso de indeclinável necessidade, forem os operadores obrigados a permanecer em serviço além do período normal fixado neste artigo, a empresa pagar-lhes-á extraordinariamente o tempo excedente com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o seu salário-hora normal. (CLT, art. 227, § 1º)

Sergio Pinto Martins (2010, pg. 144) e Alice Monteiro de Barros (2008, pg. 127), ao tratarem sob o § 1º, do art. 227  da CLT em seus estudos, o interpretam como sinônimo de necessidade imperiosa, tratado no artigo 61 da CLT que só permite o labor extraordinário por serviço inadiável, força maior, ou serviço cuja não execução possa acarretar prejuízo manifesto.

Doutra banda, vejamos o que os itens 5.3 e 5.3.1, do Anexo II, da Norma Regulamentadora 17, trazem sobre o tema:

O tempo de trabalho em efetiva atividade de teleatendimento/telemarketing é de, no máximo, 06 (seis) horas diárias, nele incluídas as pausas, sem prejuízo da remuneração. (NR 17, Anexo II, item 5.3.)

A prorrogação do tempo previsto no presente item só será admissível nos termos da legislação, sem prejuízo das pausas previstas neste Anexo, respeitado o limite de 36 (trinta e seis) horas semanais de tempo efetivo em atividade de teleatendimento/telemarketing. (NR 17, Anexo II, item 5.3.1)

Desta forma, não pairam dúvidas de que a jornada do trabalhador de teleatendimento deve respeitar o limite máximo de seis horas contínuas de trabalho por dia ou 36 (trinta e seis) horas semanais, sendo ainda devido, o adicional de horas extras com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o seu salário-hora normal, quando ultrapassado este limite.

2.1.            DO PAGAMENTO EM DOBRO DO REPOUSO SEMANAL QUANDO CONCEDIDO APÓS O SÉTIMO DIA DE LABOR

As empresas de call center, adotam sistemas de revezamento para organizar a jornada mensal de labor, contudo, muitas das vezes por não ter uma quantidade suficiente de trabalhadores, e ou, por falta de organização mesmo, acabam obrigando seus obreiros a trabalharem por até doze dias consecutivos, mesmo sem pagarem o adicional de horas extras após as 36 h de labor na semana, e o repouso semanal remunerado em dobro.

A origem do repouso semanal é essencialmente religiosa. Mesmo antes de haver leis obrigando a concessão do repouso, a força da religião já impunha a observância da suspensão das atividades obreiras em um dia da semana, a fim de que as pessoas pudessem participar das cerimônias religiosas.

Segundo o livro do Gênesis, capítulo 2, versículos de 1 a 3, Deus, após criar o mundo, descansou no sétimo dia:

1 Assim foram acabados os céus e a terra, com todo o seu exército.

2 Ora, havendo Deus completado no dia sétimo a obra que tinha feito, descansou nesse dia de toda a obra que fizera.

3 Abençoou Deus o sétimo dia, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que criara e fizera. (GÊNESIS, capítulo 2, versículos de 1 a 3)

Para Arnaldo Sussekind (2005. p. 831), com o advento da Revolução Industrial, o instituto do repouso semanal passou a se sustentar em outros fundamentos: biológicos, que visam eliminar a fadiga gerada pelo trabalho; sociais, que possibilitam a prática de atividades recreativas, culturais e físicas, bem como o convívio familiar e social; econômicos, que tem por escopo aumentar o rendimento no trabalho, aprimorar a produção e restringir o desemprego.

No Brasil, o direito ao repouso semanal remunerado está previsto na Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso XV, que assim estatui: "repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos"

Insta destacar, que nosso país é signatário das Convenções 14 e 106 da Organização Internacional do Trabalho, que integram nosso ordenamento jurídico com força de lei federal, em decorrência do decreto nº 10.088, de 5 de novembro de 2019.

A Convenção 14 da Organização Internacional do Trabalho, mais especificamente em seu art. 2°, item 1, traz que:

 Todo o pessoal ocupado em qualquer estabelecimento industrial, público ou privado, ou nas suas dependências, deverá, ressalvadas as exceções previstas nos artigos presentes, ser beneficiado, no correr de cada período de sete dias, com um repouso, ao menos de 24 horas consecutivas. (OIT, Convenção 14)

Outrossim, a Convenção 106 da referida Organização, traz insculpido em seu art. 6°, item 1, o seguinte:

Todas as pessoas às quais se aplica a presente convenção terão direito, sob ressalva das derrogações previstas nos artigos seguintes, a um período de repouso semanal, compreendendo um mínimo de vinte e quatro horas consecutivas, no decorrer de cada período de sete dias.  (OIT, Convenção 106)            

Doutra banda, conforme já fora delineado no início deste artigo, o trabalho de call center ainda é recente, nesse diapasão, não existem leis que tratem especificamente do assunto; as Convenções acima citadas quando foram criadas, abordaram todos os serviços que existiam até aquele momento, então, por assim entende-se que atualmente deve ser estendida à todas existentes também.  

Nesse diapasão, diante das Convenções acima mencionadas, resta bastante claro que deve ocorrer um descanso de ao menos 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, no período máximo de a cada 7 (sete) sete dias, e não como as empresas tentam adotar, que é um descanso sob a semana civil, entendida essa como o período entre uma segunda feira e o domingo seguinte.

Arnaldo Sussekind (2005, p. 837)leciona que o descanso deve ocorrer no máximo no sétimo dia corrido:

(...) Mas, nessa escala, o repouso semanal deverá ser garantido após o período máximo de seis dias, não podendo ser concedido, em determinada semana, depois de sete dias de trabalho. (SUSSEKIND, Arnaldo, Instituições de direito do trabalho, 2005, p. 837)

Na mesma esteira é o ensinamento de Pedro Paulo Teixeira Manus (2006, p. 109):

Observe-se, então, que apesar da faculdade de o empregador poder alterar o dia de repouso, do domingo para outro dia, ainda assim, haverá de observar o lapso máximo de seis dias de trabalho contínuo para a concessão do repouso semanal. (MANUS, Pedro Paulo Teixeira, Direito do trabalho, 2006, p. 109)

A jurisprudência pacífica do Tribunal Superior Trabalho, também segue a mesma linha de entendimento das lições acima citadas, senão vejamos a ementa de alguns julgados:

RECURSO DE REVISTA. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. CONCESSÃO APÓS O SÉTIMO DIA CONSECUTIVO DE TRABALHO. OJ n.º 410 DA SBDI-1 do TST.

O repouso semanal remunerado está assegurado no artigo 7º, XV, da CRFB, correspondendo ao período de folga dentro do período semanal de trabalho, devendo ser respeitada a concessão no dia posterior ao sexto dia trabalhado, a teor da jurisprudência consolidada na Orientação Jurisprudencial nº 410 da SBDI-1 desta Corte Superior; a decisão regional que afastou o pagamento em dobro do descanso semanal concedido após o sétimo dia consecutivo de labor, ainda que sob o fundamento da existência de norma coletiva benéfica, está em contrariedade à iterativa, notória e atual jurisprudência da SBDI-1 do TST. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-261-17.2011.5.02.0254)       

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. 1. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. CONCESSÃO APÓS O SÉTIMO DIA CONSECUTIVO DE TRABALHO. PAGAMENTO EM DOBRO.

I. Hipótese em que a Corte Regional entendeu que a concessão de repouso semanal remunerado após o 7º (sétimo) dia consecutivo de trabalho não enseja o pagamento em dobro. II. É pacífico o entendimento desta Corte Superior no sentido de que a concessão do repouso semanal remunerado após o 7º (sétimo) dia consecutivo de trabalho viola o art. 7º, XV, da CF/88, o que implica o seu pagamento em dobro (Orientação Jurisprudencial nº 410 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais). Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-RR-1000668-13.2015.5.02.0465)

 

Existe também uma Orientação Jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho de n° 410 a cerca deste tema, a qual define que: "viola o art. 7º, XV, da CF a concessão de repouso semanal remunerado após o sétimo dia consecutivo de trabalho, importando no seu pagamento em dobro."

O art. 1°, do decreto nº 27.048, de 12 de agosto de 1949, deixa bastante claro que o repouso remunerado deve ser concedido dentro da semana, senão vejamos o conceito:

Todo empregado tem direito a repouso remunerado, num dia de cada semana, perfeitamente aos domingos, nos feriados civis e nos religiosos, de acôrdo com a tradição local, salvo as exceções previstas neste Regulamento. (DECRETO Nº 27.048/1949, art. 1°)

Nesse diapasão, diante de todo acima exposto, devidamente demonstrado através do posicionamento adotado pelas Convenções 14 e 106 da Organização Internacional do Trabalho, legislação, doutrina e jurisprudência, não pairam dúvidas de que quando a folga for concedida após o sétimo dia consecutivo de trabalho, este repouso semanal remunerado, deve ser pago em dobro.  Desta feita, resta claro que a semana civil defendida pelos empregadores é nula de pleno direito. 

2.2.            DAS HORAS EXTRAS

Conforme devidamente demonstrado acima neste estudo, a jornada do trabalhador de call center, deve ser limitada a 6 (seis) horas diárias e a 36 (trinta e seis) horas semanais. Contudo, ocorre que, o início da jornada de trabalho nestas empresas de grande porte do ramo de teleatendimento/telemarketing somente é computado após o "login" no sistema, não considerando o período despendido da portaria até o local de trabalho, sendo que este período "logado" não condiz com todo o período de labor, e que, muitas das vezes, ultrapassa inclusive 30 (trinta) minutos diariamente.

O disposto no caput do artigo 4° da Consolidação das Leis Trabalhistas, não deixa qualquer margem de interpretação, quanto a ser considerado como de serviço efetivo, o tempo em que o trabalhador esteja à disposição do empregador.

Outrossim, a súmula de n° 429 do Tribunal Superior do Trabalho dispõe que o período de deslocamento entre a portaria e o local de trabalho, desde que supere o limite de 10 (dez) minutos diários, deve ser computado como tempo à disposição do empregador, senão vejamos abaixo:

TEMPO À DISPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. ART. 4º DA CLT. PERÍODO DE DESLOCAMENTO ENTRE A PORTARIA E O LOCAL DE TRABALHO.
Considera-se à disposição do empregador, na forma do art. 4º da CLT, o tempo necessário ao deslocamento do trabalhador entre a portaria da empresa e o local de trabalho, desde que supere o limite de 10 (dez) minutos diários. (TST, Súmula n° 429)

Insta destacar, que para o ingresso nestas empresas, são utilizados crachás de identificação para passar pelas catracas, os quais deveriam ser considerados como os cartões de ponto destes trabalhadores. A súmula 366 do Tribunal Superior do Trabalho traz que:

CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO.

Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal, pois configurado tempo à disposição do empregador, não importando as atividades desenvolvidas pelo empregado ao longo do tempo residual (troca de uniforme, lanche, higiene pessoal, etc). (TST, Súmula n° 366)

 

Nesse diapasão, devemos considerar que toda vez que o trabalhador demorar mais do que 10 (dez) minutos diários, entre o deslocamento da portaria até a ocupação efetiva do posto de trabalho (considerando aqui este, quando ocorre o login no sistema), deve tal período ser considerado como de serviço efetivo. Destaca-se que este período de deslocamento superior à 10 (dez) minutos é comum nas empresas de grande porte em decorrência de seus grandes pátios.

Ocorre que, conforme já delineado acima, as grandes empresas deste ramo do teleatendimento, não consideram tal período como de efetivo serviço, tampouco remuneram os obreiros por tal. Destaca-se que sobre este período, deveriam incidir as horas extras.

Maurício Godinho Delgado diz que: “jornada extraordinária é o lapso temporal de trabalho ou disponibilidade do empregado perante o empregador que ultrapasse a jornada padrão, fixada em regra jurídica ou por cláusula contratual.” (DELGADO, 2016, p. 1020)

A nossa Constituição Federal de 1988, traz em seu capítulo dos DIREITOS SOCIAIS, artigo 7°, inciso XVI, que a “remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal;”

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é firme neste sentido, senão vejamos o julgado abaixo:

HORAS EXTRAS. 30 MINUTOS. DESLOCAMENTO ENTRE A PORTARIA E O TRABALHO. A jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que o tempo despendido pelo trabalhador entre a portaria e o posto de trabalho deve ser considerado como à disposição do empregador, nos moldes do art. 4.º da CLT, quando superar o limite de 10 minutos diários. Nesse sentido dispõe a Sumula 429 do TST . Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR - 218500-47.2005.5.02.0464)

 

HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM A JORNADA DE TRABALHO. No que diz respeito aos minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho, esta Corte já pacificou a questão acerca do critério de apuração dos controles de frequência e de horas extras, por meio da edição da Súmula 366 do TST. Assim, todo o período registrado no cartão de ponto configura tempo à disposição do empregador, sendo irrelevante a discussão acerca da natureza das atividades desen volvidas pelo empregado nos minutos residuais da jornada de trabalho, se destinado à troca de uniforme, alimentação e higiene pessoal ou a outros afazeres pessoais. Recurso de revista não conhecido. (TST - RR - 218500-47.2005.5.02.0464)

 

Desta feita, temos que sempre que os trabalhadores ultrapassarem o limite estabelecido contratualmente, que no caso deste estudo em específico é de 6 (seis) horas diárias, devendo ainda ser considerado o tempo de deslocamento entre a portaria e a efetiva ocupação do posto de trabalho, e não somente o período logado no sistema, as empresas devem pagar o acional de horas extras, com um acréscimo de no mínimo, cinquenta por cento sobre o valor da hora normal e os seus reflexos legais.

2.3.            DO INTERVALO INTRAJORNADA SUPRIMIDO 

Diante do acima exposto, tendo em vista que em regra a jornada de trabalho dos trabalhadores de teleatendimento, ultrapassa o limite de 6 (seis) horas diárias, pois não é computado o tempo despendido entre a portaria destas empresas e o ingresso no sistema, o intervalo intrajornada, resta por prejudicado.

Para esta categoria de trabalhadores, apesar de haver disposição expressa na Consolidação das Leis Trabalhistas, com relação ao intervalo intrajornada, mais especificamente em seu art. 71, § 1°, as pausas no setor de teleatendimento, são definidas pela Norma Regulamentadora 17, mais especificamente em seu anexo II, itens 5.4., 5.4.1, 5.4.1.1. e 5.4.2.

5.4. Para prevenir sobrecarga psíquica, muscular estática de pescoço, ombros, dorso e membros superiores, as empresas devem permitir a fruição de pausas de descanso e intervalos para repouso e alimentação aos trabalhadores.

5.4.1. As pausas deverão ser concedidas:

a) fora do posto de trabalho;

b) em 02 (dois) períodos de 10 (dez) minutos contínuos;

c) após os primeiros e antes dos últimos 60 (sessenta) minutos de trabalho em atividade de teleatendimento/telemarketing.

5.4.1.1. A instituição de pauses não prejudica o direito ao intervalo obrigatório para repouso e alimentação previsto no § 1° do Artigo 71 da CLT.

5.4.2. O intervalo para repouso e alimentação para a atividade de teleatendimento/telemarketing deve ser de 20 (vinte) minutos.

 

Nesse diapasão, para efeito de contagem do intervalo intrajornada nas atividades de teleatendimento, devemos considerar um período de 20 (vinte) minutos para repouso e alimentação, quando a jornada não exceder as 6 (seis) horas diárias.

Contudo, ocorre que, diante de todo o acima exposto neste artigo, em regra a jornada dos trabalhadores deste setor, ultrapassa diariamente as 6 (seis) horas diárias, e, em muitas situações, este período é extrapolado em mais de 10 (dez) minutos diariamente, principalmente nas empresas de grande porte, devido aos seus grandes pátios e portarias.

Desta feita, resta claro que quando ultrapassada a jornada de 6 (seis) horas, deve se seguir o disposto no caput do artigo 71 da Consolidação das Leis Trabalhistas, e se não for concedido o devido intervalo intrajornada de 1 (uma) hora, deve este período total, e não apenas aquele suprimido, ser remunerado com acréscimo de, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho, nos termos da Súmula n° 437 do Tribunal Superior do Trabalho, abaixo transcrita.                  

 

INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 307, 342, 354, 380 e 381 da SBDI-1) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

 I - Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração.

II - É inválida cláusula de acordo ou convenção coletiva de trabalho contemplando a supressão ou redução do intervalo intrajornada porque este constitui medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, garantido por norma de ordem pública (art. 71 da CLT e art. 7º, XXII, da CF/1988), infenso à negociação coletiva.  

III - Possui natureza salarial a parcela prevista no art. 71, § 4º, da CLT, com redação introduzida pela Lei nº 8.923, de 27 de julho de 1994, quando não concedido ou reduzido pelo empregador o intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, repercutindo, assim, no cálculo de outras parcelas salariais.

IV - Ultrapassada habitualmente a jornada de seis horas de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o empregador a remunerar o período para descanso e alimentação não usufruído como extra, acrescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, caput e § 4º da CLT. (TST, Súmula n° 437)

 

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é pacífica neste sentido, senão vejamos o julgado abaixo, no qual inclusive este aluno redator deste artigo, atuou em favor da parte Autora naqueles autos.

RECURSO DE REVISTA. INTERVALO INTRAJORNADA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. DECISÃO EM DESCONFORMIDADE COM A SÚMULA Nº 437, IV, DO TST.

Nas razões de revista, nas quais cuidou de indicar o trecho da decisão recorrida que  consubstancia  o  prequestionamento  da controvérsia objeto da insurgência atendendo ao disposto no art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a parte recorrente indica ofensa aos arts. 7°, XXII, da Constituição Federal, e 71 da CLT, bem como contrariedade à Súmula n° 437, IV, desta Corte Superior. Transcreve arestos.

Sustenta, em síntese, que, ao contrário do que entendeu o Regional, o intervalo intrajornada de 01 (uma) hora é devido quando o labor for superior a 06 (seis) horas, e não apenas quando exceder a 06 horas e 30 minutos.

...

Assim, ao determinar que o intervalo intrajornada somente seria devido quando o labor extraordinário fosse superior a 30 minutos o Regional incorreu em possível contrariedade à Súmula 437, item IV, desta Corte, motivo pelo qual reconheço a transcendência política da matéria e conheço do recurso de revista.

Ante o exposto, com fulcro no art. 118, X, do RITST, conheço do recurso, por contrariedade à Súmula nº 437, IV, do TST e, no mérito, por consectário lógico, dou-lhe provimento para afastar a limitação imposta e reconhecer o direito às horas extras decorrente do intervalo intrajornada  sempre  que  houver  extrapolação  da  jornada  de  6h, independentemente do tempo da sobrejornada. (TST-ARR-10408-73.2018.5.18.0008)

 

Doutra banda, assim como exposto no tópico anterior, temos que sempre que os trabalhadores ultrapassarem o limite estabelecido contratualmente, que no caso deste estudo em específico é de 6 (seis) horas diárias, as empresas devem conceder o intervalo intrajornada de 1 (uma) hora, e no caso de sua supressão, devem pagar o período total, com um acréscimo de no mínimo 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho, nos termos da Súmula n° 437 do Tribunal Superior do Trabalho, e seus reflexos legais.

  1. 3.                  CONCLUSÃO

Com o presente estudo, demonstrou-se que a jornada dos trabalhadores de teleatendimento é limitada a 6 (seis) horas diárias e a 36 (trinta e seis) horas semanais, por se enquadrar em uma jornada especial de trabalho, para assim o trabalhador poder satisfazer as suas necessidades mentais e físicas, garantindo sua saúde e bem-estar, sendo ainda devido, o adicional de horas extras com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o salário-hora normal, quando ultrapassado este limite.

Demonstrou-se ainda, com enfoque na correta interpretação de nossa legislação, Convenções da Organização Internacional do Trabalho, jurisprudência e doutrina, que o repouso semanal deve ser concedido no período máximo de a cada 7 (sete) sete dias, sob pena de seu pagamento em dobro, devendo ser considerada nula de pleno direito a semana civil defendida pelos empregadores, segundo a qual, o descanso poderia ser concedido após o sétimo dia de labor, desde que, dentro da respectiva semana.

Outrossim, trouxe também que o tempo despendido entre as catracas das empresas e o ingresso no sistema, é considerado tempo à disposição do empregador, nos moldes de nossa legislação e jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho, devendo tal período ser computado para todos os fins, o que traz reflexos nas horas extras e no intervalo intrajornada.

Dessa forma, pode-se concluir diante da interpretação correta de nossa legislação, Convenções da Organização Internacional do Trabalho, normas regulamentadoras, jurisprudências e doutrinas, que direitos fundamentais dos trabalhadores de teleatendimento têm sido afrontados, principalmente nas empresas de grande porte, em sendo assim, espera-se que o paralelo aqui enfatizado entre os erros das empresas, e as normas jurídicas corretas a serem aplicadas a cada caso demonstrado neste estudo, sirvam para advogados, juízes, conciliadores, doutrinadores e demais juristas, de forma a solucionar os problemas que esta classe de trabalhadores sofre.

  1. 4.                  REFERÊNCIAS

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 2 de julho de 2020.

MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT.14. edição. São Paulo: Atlas, 2010. 

BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. 3. edição. São Paulo: LTr, 2008.  

SUSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 20ª ed. São Paulo: LTr, 2005.

MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do trabalho. 10a ed. São Paulo: Atlas, 2006.

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, processo n° TST-RR-261-17.2011.5.02.0254. Publicado no DJ de 14/11/2014. Disponível em https://www.tst.jus.br/. Acesso em 3 de julho de 2020. 

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, processo n° TST-RR-1000668-13.2015.5.02.0465. Publicado no DJ de 10/08/2018. Disponível em https://www.tst.jus.br/. Acesso em 6 de julho de 2020.

ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL n° 410 da SDI1 do TST, de 26 de Outubro de 2010. Disponível em http://www.tst.jus.br/web/guest/ojs. Acesso em 8 de julho de 2020.  

CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, de 1° maio de 1943. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 9 de julho de 2020 

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, revisto e ampliado. 15ª edição. Editora LTR80. São Paulo. LTR, 2016.

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, processo n° RR - 218500-47.2005.5.02.0464. Publicado no DJ de 17/04/2020. Disponível em https://www.tst.jus.br/. Acesso em 10 de julho de 2020. 

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO, processo n° TST-ARR-10408-73.2018.5.18.0008. Publicado no DJ de 20/02/2020. Disponível em https://www.tst.jus.br/. Acesso em 10 de julho de 2020.  

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, Convenções 14 e 106. Disponíveis em https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_235015/lang--pt/index.htm e https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_235196/lang--pt/index.htm. Acesso em 10 de julho de 2020.  

NORMA REGULAMENTADORA 17 - Ergonomia. Anexo II. Disponível em https://www.guiatrabalhista.com.br/legislacao/nr/nr17_anexoII.htm. Acesso em 10 de julho de 2020.


Henrique Vinícius Francisco Pereira

Henrique Vinícius Francisco Pereira

MBA em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Faculdade Legale. Pós-Graduando em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás. Pós-Graduando em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade Legale.

Ver todos os artigos do Autor





Baixar o Artigo